quarta-feira, 9 de abril de 2008

Dito e Feito


Depois da minha exaltação patriótica anterior decidi arregaçar as mangas e lançar mãos à obra neste novo desígnio nacional, capaz de catapultar a nossa economia para níveis nunca antes alcançados.
Por isso decidi investigar o que é necessário para aproveitar os nossos recursos seminais e colocá-los ao serviço dos mais altos interesses públicos.
Como os americanos é que inventaram o negócio, decidi copiar um bocadinho e ver como é que eles fazem (para depois poder melhorar o método, antes de o implementar de norte a sul do país, claro está…).
Parece que em primeiro lugar é preciso um banco de esperma…
Bom, eu preferia fazer o trabalhinho no conforto do meu lar, que tão boas recordações me traz… mas pronto, se o interesse nacional assim o exige, também não deve ser muito difícil abrir mais uns bancos por todo o país (ao ritmo que têm aberto nos últimos anos até poderíamos aproveitar alguns dos balcões semi-desertos que por aí há… sempre lhes dávamos alguma coisa para fazer).
Até me admira que os bem pagos administradores do pujante sector bancário nacional não se tivessem lembrado disso… Devem andar todos distraídos com a crise do BCP, a fusão deste com o BPI e as entrevistas do Joe Berardo.
Depois de encontrado o banco de esperma é preciso preencher determinados critérios de admissão, a saber:
a) ter entre 18 e 34 anos (pronto, já me estragaram o negócio…);
b) ter mais de 1,80 m (devem estar a gozar…);
c) não ter excesso de peso (estamos a falar de americanos?!);
d) possuir uma licenciatura (querem ver que é preciso um curso superior para acertar no frasquinho…);
e) nunca ter tido doenças como a hepatite B, C, HIV, herpes genital, ébola e outras coisas más;
f) ter sexo masculino.
Desculpem o desabafo (em estilo Gosciniano e dedicado aos amantes da 9ª arte), mas estes americanos são doidos!
Indicar nos requisitos que é obrigatório ter sexo masculino parece-me um pouco supérfluo. Mas enfim, eu não sei que género de raparigas é que eles têm lá nos States…
Não ter tido doenças mazinhas, até me parece razoável. Agora ter mais de 1,80m e uma licenciatura! Isto parece uma forma de açambarcarem o negócio só para eles…
Mas parece que não. Que os casais que se inscrevem nesses bancos, dispostos a adquirir esperma para inseminação artificial, não querem comprar artigo de segunda qualidade… Só lhes interessa sémen de doutores e com mais de um metro e oitenta!
Enfim… americanices.
Eu acho que, por cá, não era preciso ser tão exigente.
Qualquer português com mais de um metro e meio e a 4ª classe bem tirada já metia os doutores americanos todos num canto. E como aquilo vai tão bem embrulhado no frasquinho… (até podíamos pôr um daqueles tecidos garridos como nos frascos de compota da quinta, à laia de produto biológico) ninguém sabe.
Como o dador é anónimo, não me parece um problema à altura da iniciativa nacional.
Como é costume, a gente desenrasca-se. Põe-se lá a dizer que preenche os requisitos e depois eles que reclamem, se quiserem!
O passo seguinte é fazer três doações, para eles investigarem o conteúdo do esperma: contarem os espermatozóides, averiguar se são bons nadadores, como é que reagem ao transporte no frio, se são bem feitinhos e ficam bem no retrato… enfim, essas mariquices todas.
Ao que parece rejeitam entre 50 e 90% dos candidatos nesta fase.
Mas isto é com dadores americanos… Tenho a certeza que os portugueses se safavam muito melhor. Olha espermatozóides para nós… aquilo é sempre a aviar!
O quarto passo é a análise da história clínica da família até à quarta geração.
Estes tipos são uns brincalhões, só pode…
Tomara nós que a funcionária da caixa encontre a nossa ficha e um médico de família para nos atender, quanto mais arranjar relatórios com o historial médico do meu tetravô!
Sei lá eu sequer, se tive tetravô! Quanto mais se ele sofria de gosma ou tinha bicos de papagaio…
Não senhor! Cá em Portugal vigora o Simplex… leva-se um atestado médico passado pelo médico de família (se não tiver nenhum, como acontece com muitos milhares de portugueses, pode sempre pedir um atestado na junta de freguesia, com o carimbo de dois comerciantes da terra) comprovando que sempre foi um rapaz saudável e amigo do seu amigo… E chega!
Era o que faltava, virem agora os americanos impingir-nos mais burocracias.
De seguida há que fazer um exame médico completo, com análises ao sangue e à urina (passamos a vida com o frasquinho atrás…), o qual se mantém periodicamente durante o tempo em que fizer depósitos. Se passar sempre nos testes pode continuar a depositar.
Finalmente assina-se um contrato que:
a) Declina quaisquer direitos sobre os filhos concebidos com o esperma entregue, o qual permanecerá anónimo;
b) Obriga à frequência de um programa de 6 meses a 3 anos, durante o qual temos de nos manter de boa saúde e reportar qualquer doença que eventualmente surja;
c) Obriga à abstinência sexual (de qualquer género, incluindo o onanístico) durante os cinco dias que antecedem cada depósito;
d) Limita a utilização do esperma depositado à concepção de 10 filhos, após o que somos colocados fora do mercado.
Mais burocracias, querem eles dizer…
A primeira obrigação não oferece obstáculos de maior. Se eu quisesse ter mais filhos não ia depositá-los ao banco!
Para me obrigarem à segunda e à terceira teriam de colocar um polícia 24 horas atrás de mim, pelo que estarem lá no contrato ou não estarem, é igual ao litro…
A quarta também não me tira o sono. Do modo como funcionam os nossos serviços de saúde, quando eles se apercebessem de quantos filhos tinham sido concebidos com os meus depósitos já me estavam a dever para cima de um dinheirão… E eu guardava os talõezinhos de depósito todos, pois nunca se sabe o dia de amanhã!
Pronto, agora só falta receber.
Os preços podem rondar os 200 dólares por semana, o que, sem ser nenhuma fortuna, sempre paga a prestação do carro… (ainda assim fica abaixo do valor pago por idêntica quantidade de sémen de um boi premiado, o que dá que pensar quanto à hierarquia de valores vigente na nossa sociedade!).
Agora que já sabem como é que a coisa funciona, só falta implementá-la entre nós.
Fica aqui o repto lançado aos políticos deste país.
Como eu, arregacem as mangas e ponham o meu plano de salvação nacional em marcha.
Estão muitos milhões de portugueses, com as calças em baixo, à vossa espera.

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